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Com imposto maior, milionários franceses correm para exílio fiscal

27 jul 2012 - 13h03
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Desde a campanha eleitoral para a presidência da França, as promessas do então candidato socialista François Hollande já tiravam o sono dos milionários do país, temendo serem obrigados a dar para o Estado uma quantia cada vez maior do patrimônio. Dois meses após a eleição, os contornos da reforma fiscal desejada pela esquerda começam a se desenhar - e a lista de empresários, esportistas e artistas que planejam deixar o país não para de crescer.

A pesada mordida do Leão francês visa pessoas físicas que recebem mais de 1 milhão de euros (R$ 2,47 milhões) por ano. O Instituto Nacional de Estatísticas e Estudos Econômicos estima que o número de contribuintes com salários superiores a este é de 29 mil franceses. A reforma fiscal vai conclamar todas as camadas sociais a pagar mais tributos para ajudar o Estado a chegar ao equilíbrio fiscal até 2017, mas serão os ricos que deverão colocar mais fundo as mãos no bolso. Duas medidas específicas atingem este público: a elevação do chamado Imposto de Solidariedade sobre a Fortuna (ISF), em vigor desde 1982, e o aumento da alíquota do imposto de renda para até 75%.

Os anúncios provocaram uma verdadeira corrida dos afortunados aos escritórios de advogados fiscais, em busca de um exílio fiscal para poupar as economias. A Suíça, a Bélgica, Luxemburgo, Mônaco eo Reino Unido são as opções preferidas entre os empresários e esportistas, enquanto celebridades aproveitam a desculpa de alargar horizontes profissionais em Hollywood, nos Estados Unidos.

O assunto é tabu: poucos ousam desvendar a expatriação fiscal em público. Na semana passada, a respeitada revista Le Nouvel Observateur publicou uma reportagem, baseada quase toda em fontes anônimas, em que relata as escolhas de dezenas bem-sucedidas personalidades francesas para escapar do fisco. Os tenistas Gaël Monfils, Jo-Wilfried Tsonga, Gilles Simon, Richard Gasquet são alguns dos que se instalaram na Suíça, enquanto os jogadores de futebol Franck Ribéry e Karim Benzema, estrelas da seleção de futebol, também não pagam mais impostos no país, assim como a estrela das quadras de basquete Tony Parker. O ídolo Zinedine Zidane, apesar de militar por Hollande e declarar apoio a que os ricos paguem mais tributos, tergiversa quando perguntado sobre se pretende retornar a residência fiscal da Espanha pela França.

Estes são apenas alguns nomes das dezenas que já haviam deixado o país de origem nos anos precedentes, desde que a França apertou o cerco contra as contas bancárias volumosas. O astro do rock Jonny Hallyday, o cantor Charlez Aznavour, o escritor Marc Lévy, o galã Alain Delon, a musa Emmanuelle Beart e o ator Dany Boom já não pagavam impostos na terra natal antes mesmo da eleição do socialista.

A recente contratação multimilionária do jogador Zlatan Ibrahimovic pelo Paris Saint-Germain foi o exemplo mais recente do quanto as novas regras estão mexendo com o mercado de salários nas alturas: para garantir o contracheque anual de 14 milhões de euros (R$ 34,58 milhões) líquidos para o jogador, o Paris Saint-Germain poderá ser obrigado a desembolsar outros 89 milhões de euros (R$ 219,9 milhões) a mais, apenas para se acertar com a receita francesa.

"Nós reabrimos o nosso serviço de exílios fiscais. Nos últimos dois meses, os pedidosse acumulam", afirma o contador Bernard Monassier, que administra algumas das maiores fortunas francesas. "Os clientes estão preocupados. Chegam ao escritório munidas de bastante informação, o que não era comum antigamente."

Entenda as medidas

O ISF é uma taxa progressiva que parte de 0,25% para os patrimônios superiores a 1,3 milhão de euros (R$ 3,21 milhões) e sobe para 0,50% no caso dos bens superiores a 3 milhões de euros (R$ 7,4 milhões), o que neste ano deve engordar as caixas do Estado em 5,7 bilhões de euros (R$ 14 bi). O governo deseja implantar novas fatias de tributos, e todas sofrerão um aumento mínimo de 14% na taxa, no caso dos valores menores. A elevação poderá chegar a até 143% nos patrimônios mais caros que 4 milhões de euros (R$ 9,8 milhões).

Já a alta do imposto de renda é a medida que mais assusta a classe A. Os detalhes da proposta ainda estão sendo discutidos e só devem ser finalizados no final do ano, mas a princípio deve funcionar da seguinte maneira: se for aprovada, mudança prevê que, a partir do ano que vem, quem recebe a partir de até 70,8 mil euros (R$ 174,9 milhões) por ano será taxado em até 41%, como atualmente, e sobre os valores a partir de 1 milhão (R$ 2,47 milhões), a alíquota sobe para até 75%. Desta forma, em quantias arredondadas, uma pessoa que ganha 1,1 milhão, por exemplo, deverá pagar 410 mil referentes à primeira fatia e mais 75 mil para completar a segunda, em um total de 485 mil euros de impostos.

"São medidas simbólicas, mais para reverter a imagem de 'presidente dos ricos' que tinha Sarkozy, do que de fato para elevar a arrecadação", analisa o diretor-adjunto do departamento de Análises e Previsões do Observatório Francês, Eric Heyer. "Um punhado pequeno da população é atingida, o que faz o governo retomar a imagem de promover a justiça social, atenuando as tensões decorrentes da crise econômica."

Uma prova de que a tática agrada aos franceses é uma pesquisa divulgada há duas semanas pelo instituto Ifop, segundo a qual 53% da população concorda com o aumento do ISF. Até mesmo entre a classe média alta o índice de aprovação da medida também é grande, de 52%. Os números refletem a disposição dos franceses em contribuir com a saída da crise: 67% deles estão prontos para fazer sacrifícios em nome da melhora da situação financeira do país, de acordo com essa sondagem. Em relação à alta para o imposto sobre os milionários, 57% dos franceses a acham uma boa ideia.

O governo diz que o aumento dos impostos sobre os ricos "vai durar o tempo que for necessário" para o Estado colocar as contas em dia, nas palavras do ministro do Orçamento, Jérôme Cahuzac. A intenção é de que o equilíbrio fiscal ocorra até 2017, mas na prática, nenhuma administração conseguiu eliminar o ISF desde a sua criação, apesar das promessas. A Suíça e a Espanha são os únicos países europeus que aplicam tributos semelhantes.

Fonte: Especial para o Terra
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