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Criada por escritor, grife vira símbolo da periferia de SP

Ferréz conta como fez da marca de roupas 1 da Sul uma fonte de renda e de orgulho para a população do bairro do Capão Redondo

22 mai 2014 - 08h00
(atualizado às 08h00)
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O escritor Ferréz criou a 1 da Sul em uma brincadeira de 1º de abril. Hoje, a marca é usada com orgulho por moradores do Capão Redondo e de outros bairros periféricos de São Paulo
O escritor Ferréz criou a 1 da Sul em uma brincadeira de 1º de abril. Hoje, a marca é usada com orgulho por moradores do Capão Redondo e de outros bairros periféricos de São Paulo
Foto: Bruno Meirelles/PrimaPagina

Uma brincadeira de primeiro de abril que foi levada muito a sério e se transformou em uma famosa grife da periferia de São Paulo. Esta é a história da 1 da Sul, que em 15 anos cresceu e hoje conta com 72 produtos diferentes, incentiva trabalhadores locais e paga a eles uma remuneração bem acima do ofertado por grandes marcas de roupas, além de usar parte de sua renda para promover eventos culturais em regiões carentes.

A ideia nasceu durante uma conversa despretensiosa entre três amigos na noite de 1ª de abril de 1999. Entre eles estava o escritor Reginaldo Ferreira da Silva, mais conhecido como Ferréz, autor de livros como “Capão Pecado”, que já ganhou traduções para o inglês, alemão, espanhol e italiano. Ao ouvir de um dos colegas que nada estava acontecendo no Capão Redondo, bairro periférico da Zona Sul de São Paulo, Ferréz resolveu inventar uma história.

“Você não ficou sabendo da 1 da Sul? É um movimento que surgiu esses dias e está promovendo um monte de shows e festas por aí”, brincou. Os amigos, porém, levaram a sério, e Ferréz acordou no dia seguinte decidido a bordar alguns bonés com a marca para vender entre os colegas. Conseguiu dinheiro para fazer apenas cinco, mas foi o suficiente para a iniciativa começar a se espalhar.

“Eu era do movimento punk e sempre fui muito crítico com quem trabalhava o mês inteiro e gastava todo o dinheiro que tinha para comprar uma roupa de marca estrangeira. Mas as pessoas me diziam que não existia outra opção, então resolvi criar uma”, resume.

A crescente procura pelos bonés fez com que Ferréz se associasse a Dark, um amigo grafiteiro, que passou a criar adesivos automotivos com a marca. “Foi dessa forma que comecei a perceber que também poderia usar a 1 da Sul para gerar renda para os moradores do meu bairro”, diz.

Assim, quando o escritor resolveu incorporar camisetas ao portfólio e instalou o primeiro ponto de venda da grife, na garagem de sua mãe, ele começou a procurar por oficinas de costura no próprio Capão Redondo, para incentivar a produção local. “Eu não fazia ideia, mas descobri que existia gente no Capão produzindo para grandes marcas e recebendo pouco por isso. Para completar, quem estragava um vestido tinha de pagar o preço de venda para a marca, que era muito alto. Então decidi propor uma relação mais justa com eles”, explica.

O sucesso da iniciativa foi tão grande que, ao buscar as 100 camisetas que havia encomendado, Ferréz foi surpreendido por receber apenas 70. “O dono da oficina falou que os funcionários gostaram tanto delas que levaram para casa e pediram para descontar direto do holerite. Esse é um dos maiores orgulhos que eu tenho”, conta o escritor.

A explicação para o sucesso é simples. Ao estampar a camiseta com pessoas comuns e com frases presentes na boca dos moradores da região, a 1 da Sul conseguiu criar uma identificação única com seu público. Além disso, desde o início a grife esteve ligada a artistas com forte influência nessas regiões, como Chorão, ex-vocalista da banda Charlie Brown Jr., e o rapper Criolo.

“Fui muito ridicularizado no começo. As pessoas entravam na loja e perguntavam se eu tinha marcas famosas. Depois saíam dizendo que não daria certo. Mas hoje é muito fácil encontrar alguém usando uma peça nossa ou um carro com um adesivo da grife. E não apenas aqui no Capão, ela virou um símbolo para todos que vivem na periferia”, afirma.

Volta por cima

Apesar do sucesso atual da 1 da Sul, a grife teve de ser fechada durante um ano por conta de um assalto sofrido em 2003. “Vieram dois caras de moto e levaram tudo. Nós não tínhamos estoque e ficamos sem dinheiro para repor. Trabalhei durante um ano em um site de piadas na internet apenas para reunir o dinheiro necessário para reabrir a loja”, revela Ferréz.

O esforço valeu a pena. Hoje, os lucros obtidos pela 1 da Sul financiam uma série de eventos culturais no Capão Redondo, como a festa de 7 de Setembro, quermesses populares e shows de rap. Além disso, eles ajudam a manter o Selo Povo, editora responsável por publicar e divulgar autores de literatura marginal, e a ONG Interferência, que atua na educação de crianças.

“Três empresas já quiseram comprar a 1 da Sul, pois ela está muito inserida no meio da periferia. Mas ela só funciona porque o pessoal daqui me conhece, sabe da relação que temos com quem produz e das atividades que ajudamos a promover. Tudo isso faz com que as pessoas tenham orgulho de usar a marca e torna o negócio possível”, finaliza o criador da marca.

A loja da 1 da Sul fica localizada na rua Comendador Santanna, 138, Capão Redondo, São Paulo. O telefone é o 5870-7409.

Fonte: PrimaPagina
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