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Venezuela vira "escala" de turista que paga menos em passagem com dólar paralelo

As passagens internacionais podem ser compradas em bolívares por preços baratos para quem traz dólares do exterior

23 nov 2013 - 10h00
(atualizado às 10h00)
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A crise econômica que a Venezuela atravessa está atraindo um novo tipo de viajante ao país. Menos interessado em conhecer as belezas locais, o que este turista procura realmente é viajar mais barato. O controle cambial imposto pelo governo e o acesso limitado às divisas estrangeiras fez com que o país funcionasse com dois mercados de câmbio fortes, um oficial e outro paralelo. Com a moeda americana sendo negociada extraoficialmente por até sete vezes o valor oficial, as passagens internacionais podem ser compradas em bolívares por preços baratos para quem traz dólares do exterior.

As agências de viagem vendem as passagens em bolívares de acordo com a cotação oficial imposta pelo governo, que atualmente é de 6,3 bolívares para US$ 1. “O estrangeiro chega na Venezuela, troca seus dólares por bolívares no mercado informal e compra as passagens a um preço bem mais econômico”, explica a presidente da Associação Venezuelana de Agências de Viagem e Turismo, Maria Lucia Beltrán. Segundo ela, os principais compradores são de países da América Latina como Colômbia, Equador e Peru, com destino aos Estados Unidos e à Europa.

Para Beltrán, o excesso de viajantes estrangeiros poderia ser uma das causas da falta de passagens aéreas no mercado venezuelano. “Nas agências de viagem, as passagens estão esgotadas até abril de 2014, para quase todos os destinos”, afirma. Não existem estatísticas oficiais, mas ela acredita que aproximadamente 30% das passagens vendidas na Venezuela sejam destinadas a viajantes residentes em outros países. “O mais comum é pedir para amigos ou familiares comprarem as passagens, mas também observamos pessoas  que chegam e compram voos no mesmo dia, no próprio aeroporto”, afirma. “Às vezes eles ficam nos hotéis nas proximidades ou embarcam na mesma noite”, completa.

Cisney Perosa, agente de turismo no aeroporto internacional de Maiquetia, o maior do país, próximo de Caracas, acredita que a venda de passagens para estrangeiros diretamente no aeroporto é irrisória. Segundo ele, as pessoas compram com antecedência. “Eu vendo muitas passagens para parentes e amigos de clientes que moram no exterior”, diz. Ele afirma que estas vendas aumentaram nos últimos meses porque a diferença entre o dólar oficial e o paralelo nunca foi tão grande.  “Uma passagem para Miami poderia custar hoje menos de US$ 200 (na cotação do mercado paralelo)”.

Amigos

Os turistas que compram passagens desta maneira, normalmente têm amigos na Venezuela, confirma a designer gráfica venezuelana Rosana, que prefere não revelar seu verdadeiro nome. “Um amigo holandês que vinha para Caracas pagou recentemente US$ 600 por uma passagem comprada na Venezuela. Na Holanda ele pagaria uns US$ 1.500 pelo mesmo trajeto”. Ela diz que os “pedidos” dos amigos são principalmente para trechos internos e destinos próximos como Curaçao. Mas admite que, para um estrangeiro, “compensa” comprar passagens internacionais na Venezuela. “Para um turista que tem acesso ao dólar, a Venezuela é um paraíso”.

O brasileiro Eduardo, que também preferiu não ser identificado, mora em Paris e está entre estes “turistas acidentais”. Ele buscava passagens para ir ao Brasil quando um amigo, residente na Venezuela, sugeriu que ele passasse por Caracas. Eduardo aceitou a ideia. “Eu tive a ocasião de conhecer a Venezuela e, principalmente, uma excelente oportunidade financeira”.

Ele explica que pagou 18.440 bolívares por todos os trechos (Paris-Caracas e Caracas-São Paulo, ida e volta), o equivalente na época da compra a cerca de US$ 1.000. “Eu teria pago quase o dobro deste valor por uma passagem Paris-São Paulo, se comprasse na França”, afirma. Para se ter uma ideia do aumento da diferença entre as taxas de câmbio nos últimos meses, hoje Eduardo pagaria apenas US$ 409.

Apesar de existir, a transação é irregular. O Itamaraty alerta para brasileiros detidos pela polícia venezuelana ao trocar dólares no mercado paralelo em Maiquetia.

Mesmo quem burla a lei, acaba tendo problemas com o fato de que o desembarque na Venezuela não funciona como uma garantida pela empresa aérea. É o que conta o empresário francês Guillaume Petitbon, que vive em Caracas. “Eu costumava comprar passagens para meus amigos que moravam na Europa para ir a outros pontos da América Latina passando pela Venezuela. Mas muitas vezes os voos atrasavam e eles acabavam perdendo a conexão e o dinheiro da passagem.”

Turismo cambial

O controle imposto há dez anos pelo governo para a compra de moedas estrangeiras criou um verdadeiro “turismo cambial” na Venezuela. Uma das poucas maneiras de ter acesso aos dólares é comprovando uma viagem para o exterior. Por isso, muitos venezuelanos saem do país apenas para recuperar a divisa estrangeira liberada, revendê-la no mercado paralelo e ganhar dinheiro com a troca.

Outros, apenas compram as passagens, e após conseguirem uma parte da cota – a outra parte pode ser retirada somente no destino, com um cartão – não embarcam. Algumas pessoas também viajam levando os cartões de amigos e parentes para recuperar os dólares uma vez no exterior. “Devido a esta prática, muitas vezes, os aviões saem praticamente vazios do país”, afirma Beltrán.

O governo do presidente Nicolas Maduro indicou mês passado que pretende impor medidas para lutar contra o “turismo cambial”, instalando sistemas de leitores de impressões digitais nos portões de embarque, acompanhando passageiros que anulam com frequência os voos e aumentando as revistas, já bastante longas, a viajantes venezuelanos. 

Fonte: Especial para Terra
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