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Davos 2009 é marcado por cobranças e resposta americana

1 fev 2009 - 16h40
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Chegou ao fim neste domingo a edição 2009 do Fórum Mundial Econômico, na cidade de Davos, na Suíça. Em meio à expectativa sobre o novo fôlego que a administração Barack Obama pode dar ao combate à crise e a falta de expectativa em relação ao tamanho e duração dos distúrbios na economia, líderes de países em desenvolvimento cobraram o envolvimento dos Estados Unidos em ações para recuperar o sistema financeiro mundial. A resposta americana foi de que o novo governo está pronto para não só cooperar, como liderar este processo.

As primeiras cobranças aconteceram com o discurso do primeiro-ministro da China, Wen Jiabao, que defendeu a idéia de que os paíeses ricos "assumam suas responsabilidades" e "minimizem" o impacto da crise financeira nas nações em desenvolvimento. Ainda mais explícito, Jiabao instou os Estados Unidos a cooperarem com a China no combate dos atuais distúrbios econômicos.

"Ao enfrentar a crise financeira internacional, é imperativo que os dois países estreitem sua cooperação, essa é a minha mensagem à administração americana" do presidente Barack Obama, indicou Wen em Davos.

Outro dos principais líderes que esteve presente a Davos e mandou uma mensagem direta aos americanos foi o primeiro-ministro da Rússia, Vladimir Putin. O ex-presidente russo disse que, melhor do que qualquer crítica direta que pudesse fazer aos Estados Unidos, preferia lembrar da postura da delegação americana um ano atrás, na mesma Davos.

"Hoje, os bancos de investimento, o orgulho de Wall Street, quase não existem. Nos últimos 12 meses, eles divulgaram prejuízos maiores que os lucros que tiveram nos últimos 25 anos. Este exemplo sozinho reflete a situação real melhor que qualquer crítica", disse o russo, afirmndo que a delegação americana, em pronunciamentos, há um ano, falava de uma economia estável e um futuro sem problemas.

No mesmo discurso, Putin seguiu o exemplo de Jiabao e cobrou a ajuda de Obama. "Esperamos de todos os nossos parceiros na Europa, na Ásia e nos Estados Unidos - e, principalmente, da nova administração americana - esforços para fazer avançar a cooperação" no combate à crise econômica e as tensões no mundo, declarou.

A resposta americana veio no dia seguinte, o segundo dos debates em Davos. A principal conselheira do presidente Barack Obama, e sua representante no Fórum Econômico Mundial, Valerie Jarrett, disse na quinta-feira que os Estados Unidos permaneciam "prontos para liderar" e pediu políticas de cooperação global contra a crise.

"Nós começamos a agir. A nova era de responsabilidade chegou", disse ela, em palavras que lembraram o discurso de posse de Obama, no último dia 20 em Washington.

"Nós estamos prontos para trabalhar com nossos parceiros - para ouvi-los especialmente quando discordarmos", afirmou. "Nós vamos atuar com o conhecimento de que nossos destinos estão entrelaçados", completou Jarrett.

A assessora do novo governante americano também não se furtou de comentar a responsabilidade dos Estados Unidos na atual crise econômica. Ela disse que Obama acredita que a crise se deve "a uma era de profunda irresponsabilidade dos governos e dos negócios, nos Estados Unidos e em todo o mundo. O resultado foi a queda da confiança em nossa economia e em nossos mercados financeiros".

Ação do Estado

Núcleo do pensamento neoliberal nos últimos anos, o Fórum de Davos foi marcado em 2009 por uma mudança de discurso em relação ao papel do Estado na economia. Diante do colapso dos mercados, os pedidos de ajuda com maior regulamentação estiveram presentes em praticamente todos os debates sobre o tema.

O comissário europeu para o Mercado Interno e Serviços, Charlie McCreevy, afirmou que a crise de crédito mostrou que é necessária uma supervisão sobre os bancos da União Européia que fazem transações fora da comunidade.

O presidente do maior banco da Europa, o HSBC, Stephen Green, disse que as atuais regras de contabilidade e conformidade de capital pioraram a crise financeira internacional e pediu por um novo conjunto de princípios e normas para impulsionar a transparência no mercado financeiro. "A atual estrutura financeira, embora bem intencionada, provou-se inadequada e deve ser fundamentalmente revisada", disse.

O primeiro-ministro britânico, Gordon Brown, defendeu a criação de um sistema de supervisão financeira mundial. "Temos um sistema financeiro internacional, mas não um de coordenação ou de supervisão mundial, apenas supervisores nacionais", declarou Brown em coletiva conjunta com o secretário-geral da ONU, Ban Ki-Moon.

A chanceler alemã, Angela Merkel, afirmou na sexta-feira que a crise pede uma reforma das instituições financeiras globais e que um conselho econômico na Organização das Nações Unidas (ONU) pode surgir, nos moldes do já existente Conselho de Segurança, para coordenar a cooperação econômica internacional.

Merkel afirmou que deseja convocar uma reunião entre o Fundo Monetário Internacional (FMI), o Banco Mundial, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) e a Organização Mundial do Comércio (OMC) para discutir a criação do conselho. "A cooperação entre estas organizações ainda não é suficiente", disse ela, que ressaltou que os "padrões que elas já desenvolveram podem ser unificados e formar uma abordagem comum" que seria então transformada em uma espécie de constituição.

A própria organização do encontro lançou um estudo que alerta as instituições financeiras a estarem mais preparadas para atuar em um ambiente com maior regulação e intervenção do Estado, num cenário simulado até 2020. O estudo divulgado pelo Fórum Econômico Mundial ainda prevê que a mudança deve levar os bancos a serem regulados de uma maneira mais próxima do que acontece atualmente com serviços de concessão, como telefonia e eletricidade.

Protecionismo

Os pedidos de maior ação do Estado na economia vieram acompanhados de ressalvas sobre medidas protecionistas. Os Estados Unidos mais uma vez foram o alvo, após o anúncio de que, no pacote de US$ 819 bilhões aprovado pelos deputados americanos nesta semana há uma cláusula que autoriza investimentos somente com uso de matéria-prima americana.

Gordon Brown alertou que políticas protecionistas podem ser adotadas pelos países como resposta à crise financeira internacional. Em uma conferência ele disse que há o risco de um "mercantilismo financeiro", com bancos estrangeiros retraindo o capital para o seu país natal durante a turbulência.

"Isso, se não fizermos nada, vai levar a uma nova forma de protecionismo, uma retração na globalização e a redução no comércio entre os países que será seguido rapidamente por uma velha forma de protecionismo comercial do passado", disse o britânico.

Já Merkel, ao afirmar que o livre mercado deve ser protegido, disse que não deve deixar que estas forças sejam "distorcidas". "Por exemplo, eu estou muito atenta aos subsídios injetados na indústria automobilística americana. Isso pode levar a distorções e protecionismo", disse.

O diretor-geral da Organização Mundial do Comércio (OMC), Pascal Lamy, disse que os governos sofrem cada vez maiores pressões por medidas protecionistas devido à crise econômica. Segundo ele, ministros do Comércio de aproximadamente 20 nações disseram que "a situação está ficando extremamente difícil em seus países" e que "estão preocupados pelas pressões políticas" para que seus governos adotem medidas que protejam seus setores econômicos nacionais.

Lamy advertiu que a volta ao protecionismo levaria ao isolamento e que "isso pioraria as coisas" e provocaria "um efeito dominó" em outras áreas econômicas.

O Brasil foi uma das principais vozes em Davos-2009 contra o protecionismo. O ministro de Relações Exteriores, Celso Amorim, defendeu a retomada das negociações da Rodada Doha de liberalização de comércio internacional.

Amorim advertiu que se o mundo se deixar arrastar pelo "instinto protecionista" para enfrentar a crise, os países pobres serão prejudicados. "A questão comercial não é uma simples questão", disse. "Por isso, avançar na Rodada de Doha da Organização Mundial de Comércio é a melhor maneira de impor barreiras às tentações protecionistas", afirmou o ministro. "Não há como evitar medidas protecionistas em um sistema que não esteja progredindo", disse. "O instinto (em situações de crise) não é favorável ao livre comércio; é ser protecionista".

O País foi tema de um dos painéis do encontro na Suíça. Os respresentantes brasileiros deixaram uma mensagem otimista e disseram que o Brasil está preparado para enfrentar a crise.

"Acreditamos que estamos em posição muito melhor que os Estados Unidos", afirmou o presidente da Petrobras, José Sérgio Gabrielli, durante um almoço para discutir a economia brasileira. Ricardo Villela Marino, chefe-executivo do banco Itaú para a América Latina, destacou que as instituições financeiras do Brasil continuaram a liberar crédito, apesar a crise mundial.

O evento terminou com o anúncio do primeiro-ministro do Japão, Taro Aso, de que seu país tem U$ 17 bilhões para ajudar as economias asiáticas a se recuperarem e uma mensagem aos líderes mundiais de empresas e governos para que se chegue a uma medida conjunta para enfrentar a crise. "Desafios globais exigem soluções globais" foi a conclusão deixada no plenário de encerramento da reunião, em um pedido de ações coordenadas para que as economias voltem a crescer.

Com informações da Reuters, AFP, AP, BBC Brasil e The New York Times

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EFE
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Fonte: Invertia Invertia
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