PUBLICIDADE

Com desemprego em 24%, espanhóis veem Brasil como novo "El Dorado"

2 ago 2012 - 09h36
Compartilhar

Um em cada quatro trabalhadores na Espanha estão sem emprego. De acordo com o Instituto Nacional de Estatísticas, espécie de IBGE espanhol, o desemprego bateu 24,63% no segundo trimestre deste ano. No Brasil, segundo os últimos dados do IBGE, a taxa de desemprego estava em 5,8%. Essa diferença tem feito com que muitos espanhóis venham para o País em busca de vagas. De acordo com dados do Ministério do Trabalho, o número de autorizações de trabalho concedidas para os cidadãos da Espanha sobe ano a ano e atingiu 1.899 em 2011, ante 1.457, em 2010, e 1.104, em 2009.

De acordo com a diretora executiva da Câmara Oficial Espanhola de Comércio no Brasil, Maria Luisa Castelo Marin, nesse momento de crise, o Brasil é um dos destinos preferidos pelos espanhóis principalmente pela proximidade cultural e pelo desenvolvimento econômico. "A semelhança cultural, a proximidade da língua e o acolhimento do brasileiro fazem com que eles escolham o País ao invés de China e Índia", que também tiveram suas economias menos afetadas que as dos europeus.

Segundo Maria Luisa, esse profissional que quer vir para o Brasil tem a seu favor a qualificação e a experiência. "Esses profissionais trabalham principalmente nas áreas técnicas, como engenharia e arquitetura, que mais sofrem com a falta de emprego na Espanha. Como o Brasil também precisa de um número alto de profissionais qualificados eles podem preencher essas vagas", comenta.

Em 2007, no começo da atual crise econômica, uma pesquisa do Instituto Nacional de Estatísticada Espanha entre universitários espanhóis mostrou que 46% estavam dispostos a deixar o país. Em 2011, este número saltou para 98% daqueles sairiam do país ibérico para conseguir um trabalho.

Os espanhóis estão entre os que mais solicitam autorizações para trabalho temporário (de até dois anos) no Brasil, atrás apenas dos chineses, portugueses, americanos e franceses. Em 2009, os espanhóis fizeram 113 pedidos. No ano passado, esse número mais que duplicou: 314.

Dificuldades

Com experiência e qualificação, os espanhóis conseguem altos salários no mercado brasileiro, mas ainda se assustam com o custo de vida em cidades como São Paulo e Rio de Janeiro, pelo menos 50% maior do que nas maiores cidades da Espanha.

"O Brasil é o novo 'El Dorado'. E não podemos negar que este imenso país vive um momento histórico importante de desenvolvimento, mas ainda é pouco acessível para os espanhóis", diz Octavio Uña, professor de sociologia da Universidade Rei Juan Carlos de Madri. "Eles (espanhóis) têm aquela ideia utópica do país de praias, sol e alegria, mas há várias barreiras desconhecidas à primeira vista", afirma Bruno Ayllón Pino, especialista em relações entre Brasil e Espanha da Universidade Complutense.

A língua, o processo longo e caro de obtenção de visto e o alto custo de vida no Brasil acabam fazendo com que vários deles desistam no meio do caminho. Para Pino, outros fatores também devem ser levados em conta: "uma empresa não pode conceder visto a um brasileiro sem provar que não há outra pessoa no País que pode exercer o mesmo cargo, além disso, para os não qualificados os salários são muito baixos em relação ao custo de vida. No fim, o número de espanhóis que consegue chegar de fato no Brasil é menor do que o que pensamos".

De acordo com Maria Luisa, para conseguir um visto de trabalho no Brasil, o estrangeiro gasta cerca de quatro meses em processos burocráticos. Para conseguir homologar um diploma de uma universidade do exterior, o processo pode durar até três anos. "Além disso, as empresas têm que provar por meio de um processo complexo porque ela precisa desse profissional específico e porque não pode ser um brasileiro para a função".

Ainda segundo a diretora da Câmara Oficial Espanhola de Comércio no Brasil, os salários pagos no Brasil para profissionais espanhóis qualificados são "absurdamente altos" e maiores do que no país de origem, porém o custo de vida no Brasil chega a ser duas ou três vezes maior. "Embora os salários sejam mais altos, o valor de escolas, transporte, alimentação, é muito maior que em cidades como Madri e Barcelona."

Javier Garcia-Ramos, economista espanhol que trabalha em uma empresa no Brasil que trata de fusões e aquisições veio para País em fevereiro de 2012 por causa da crise que atingiu seu país. "Eu tinha trabalho em Madri, mas pensava que o futuro lá seria complicado", conta. Embora tenha conseguido um trabalho por aqui, lembra das diferenças no custo de vida dos dois países. "É caro, mas é adequado aos salários. Eu diria que aproximadamente 50% mais caro que Madri".

A professora de espanhol Maria Gomes Beboya, 29 anos, que está há dois anos no Brasil e atualmente mora em Porto Alegre, diz que se assustou com os altos preços praticados no País. "Nós, estrangeiros, costumamos achar que o Brasil é um País barato, mas a verdade é diferente. O custo de transporte, serviços como academias, escolas de língua, móveis, alimentação e carros é muito mais caro que em outro local", afirma.

Volta para casa

O total de pessoas que deixam a Espanha vem crescendo nos últimos anos e em 2011 chegou ao pico de 62 mil, o número mais alto desde 1990. Só no primeiro semestre de 2012 outros 40,6 mil foram a outros países.

Mas estes números, na verdade, escondem outra faceta: o estrangeiro retornado. Segundo Sixto Muriel, do Instituto Nacional de Estatísticas, 18 mil destes emigrantes são, na verdade, estrangeiros, principalmente latino-americanos, que conseguiram a nacionalidade espanhola e estão voltando a seus países de origem.

Ainda assim, mais de 40 mil espanhóis de nascimento foram embora em 2011. São na maioria jovens de até 35 anos formados ou muito graduados (com doutorado), segundo Uña, professor da Universidade Rei Juan Carlos de Madri. "Eles voltarão à Espanha? Não sabemos e nem eles se fazem esta pergunta agora. São médicos, arquitetos, engenheiros e profissionais do campo financeiro que buscam um lugar onde aplicar o que aprenderam", explica. Este movimento ainda pouco estudado já é chamado pelos especialistas em emigração e trabalho de "fuga de talentos".

"Quero ir para o Brasil porque é um país emergente cheio de oportunidades em todos os setores, inclusive para os não qualificados. Tem trabalho! E esta palavra brilha porque aqui na Espanha não há. E quando encontramos algum emprego decente é para um cargo de estagiário ou subalterno para o qual não te pagarão nada ou não pagarão o suficiente para pagar nem o aluguel, nem a parcela de um carro, nem nada", resume o jornalista espanhol de 30 anos Jose García Carrasco.

Fonte: Terra
Compartilhar
TAGS
Publicidade