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Presidente da Kia: hoje, tem carros que pago para vender

O presidente da Kia Motors no Brasil, o paulista de Itú José Luiz Gandini, fala sobre o Inovar-Auto, fábrica no Brasil e patrocínio do Palmeiras

11 abr 2013 - 08h23
(atualizado às 09h52)
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Gandini diz que com o Inovar-Auto precisou cortar investimentos e empregos
Gandini diz que com o Inovar-Auto precisou cortar investimentos e empregos
Foto: Divulgação

A briga não é de hoje, segundo ele, a primeira vontade aconteceu em 1998. Mas agora a definição é urgente. O presidente da Kia Motors no Brasil, o paulista de Itú José Luiz Gandini, diz que a montadora coreana terá uma fábrica no País. Mas ainda há indefinições sobre quando começarão as obras, onde ela ficará e quem vai tocar a planta.

A negociação, que segundo o empresário deve ter uma definição em 2013, foi acelerada devido à implantação do Inovar-Auto. O programa que rege o setor automotivo brasileiro, entre outras, impõe um adicional de 30 pontos percentuais de Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) a todos os carros de empresas que não se enquadrem em regras que estimulam o desenvolvimento da indústria nacional, seja por meio de fabricação por aqui, investimentos em pesquisa, entre outras. E a Kia de Gandini ainda não se decidiu sobre que regras irá adotar para ganhar o benefício da isenção desse tributo.

Com isso, segundo o empresário, para alguns modelos ele tem pagado para vender no Brasil. Desde quando as regras do programa entraram em vigor (1º de janeiro deste ano), Gandini já cortou empregos, reduziu suas margens de lucro, recebeu ajuda da Kia da Coreia e diminui investimentos. Aliás, o mais citado foi a antecipação do final do contrato de patrocínio ao Palmeiras, que será encerrado em 30 de maio. “Falam que vamos sair porque o time foi rebaixado (para a segunda divisão do Campeonato Brasileiro). Isso não tem nada a ver. Vamos sair porque não temos mais esse dinheiro”, afirma o empresário, palmeirense declarado.

O objetivo de Gandini é construir a fábrica da Kia no Brasil “o mais rápido possível”, de preferência no Estado de São Paulo, e produzir a SUV Sportage. “É o meu sonho”, diz. Ele ainda vê como possibilidade a nacionalização do sedã médio Cerato e também trazer um carro que os coreanos ainda não vendem no Brasil, mais barato e que brigaria na mesma faixa de preço do HB20, da “irmã” Hyundai.

E embora diga que cobre “diariamente” os coreanos sobre uma definição, ele ainda não sabe nem se continua a frente da marca no Brasil. Existe a possibilidade também de a matriz comprar a operação, que hoje pertence a Gandini, e assumir o comando do negócio no Brasil.

O empresário falou também sobre como o aumento dos preços do etanol, se o aumento do endividamento do brasileiro tem afetado sua empresa e do preço dos carros no Brasil. “Entra muito o lucro das empresas”. Confira.

Terra - Gostaria que o senhor começasse falando sobre o primeiro trimestre com Inovar-Auto em vigor.

José Luiz Gandini - As coisas se misturam um pouco para nós. Esses primeiros três meses do ano foram muito difíceis para nós. Porque nós estávamos como muitos Ceratos antigos e o modelo novo aí na internet, nós estávamos com muitos Sorentos seis cilindros em estoque – e que tem um público exigente, bem-informado – que sabia que tinha o face-lift lá fora e estava para chegar. Então esses produtos ficaram mais difíceis de vender. Eu coloquei esses carros no estoque da minha rede de concessionárias. Eu faturei tudo antes do final do ano passado para não pegar a alta do IPI, que subiu em 31 de dezembro. Então a minha rede de concessionários entrou o ano com mais ou menos 8 mil carros – para nós é muito carro. Isso fez com que eles passassem um período muito difícil. Agora esses estoques já baixaram muito, nós lançamos o novo Cerato, o Sorento vem agora no final do mês, e isso deu um ânimo na rede impressionante e eu acho que nós vamos fazer bons números a partir de agora. Eu diminui muito propaganda, que afeta em venda... Acabou a margem. O que eu tinha de margem para fazer investimentos em propaganda e marketing acabou tudo. E de repente eu comecei a competir com marcas que já se habilitaram ao Inovar-Auto, que não pagam os 30 pontos, e eu não posso ter essa vantagem. Eu pago 30 pontos em todos os carros que estou vendendo.

Terra - O senhor disse que a Kia está ajudando vocês a manterem preços competitivos no Brasil. Como funciona essa ajuda?

JLG -

Eles estão reduzindo os preços dos carros. Eles estão sabendo o que está acontecendo no Brasil. Eles estão ajudando com propaganda, com preço. Não resolve o problema dos 30 pontos de IPI, mas ajuda a gente a sobreviver enquanto a decisão não for tomada.

Terra - Para eles é uma questão urgente decidir sobre a fábrica no Brasil?

JLG -

Lógico! Eles não podem ficar colocando um dinheiro desse. Por isso que eu digo que resolve este ano.

Terra - Vocês mudaram o quê em função do Inovar-Auto?

JLG -

Mudou um monte de coisa. Tivemos que cortar custos, cortei margem dos concessionários – 2% da margem deles – acabei com a minha margem. Tem carro hoje que eu estou pagando para vender. Eu cortei despesas internas, tirei um diretor do negócio, mudei a estrutura organizacional inteira.

Terra - Então, o senhor cortou empregos?

JLG -

Sim, não tem como. Assim como os revendedores também cortaram. Cortei muito em propaganda. Então esse conjunto de medidas aliadas à ajuda dos coreanos deu uma sobrevida ao negócio.

Terra - O senhor citou a fábrica da Hyundai, que pertence ao mesmo grupo que a Kia, como um sucesso. Não é possível vocês adotarem uma estratégia similar? Trazer para o Brasil um carro mais barato?

JLG - 

Mas isso depende deles. A minha intenção qual era: “você montem uma fábrica no Brasil de um carro que dê volume e eu continuo distribuindo”. Esse carro é o Rio, um carro para brigar com o HB20. Então eles fariam um carro desenvolvido aqui, eu manteria a rede de concessionários deles na minha rede e continuaríamos com outros produtos. Essa é uma ideia. Outra é eles autorizarem a eu fazer um produto no Brasil. Eu gostaria muito de fazer o Sportage ou o Cerato.

Terra - Mas esses carros não brigariam com os populares?

JLG -

Mas eu não quero brigar com os populares. Eu acho que essa briga você compra com a liderança do mercado. Você briga com Volkswagen, Fiat, a própria Hyundai com o HB20. Qualquer R$ 200 que você suba no preço do carro você sai do mercado.

Terra - Mas o exemplo da Hyundai deu certo?

JLG -

Sem dúvida. Eles estão fabricando o modelo certo com o preço certo. O carro é feito para o Brasil, eles acertaram em tudo. Mas eu não quero fazer uma fábrica desse tamanho. Eu não posso sozinho investir tanto dinheiro num negócio desses. O que eu queria era fazer uma fábrica com volume de produção melhor. Meu grande sonho é fabricar o Sportage no Brasil.

Terra - O que o senhor achou da postergação da volta da cobrança do IPI?

JLG -

Acho que para o mercado é bom, está certo. Subindo o preço do carro aumenta inflação. Está certo. O que eu não acho justo é a gente pagar 30 pontos a mais que qualquer carro nacional. Não adianta, quanto mais aumentar imposto, mais cai a produção. Quanto mais barato o produto, você vende mais. E acho que agora foi melhor porque prorrogou até o final do ano. Não adianta prorrogar por 30 dias. Isso funciona naqueles últimos dias do mês, quando está para subir.

Terra - O senhor acha que o preço do carro no Brasil é muito caro em relação a outros países?

JLG -

É mais caro por causa dos impostos. Quando o carro chega no Brasil você paga 35% de imposto de importação. Aí quando você vai emitir a nota de venda, você paga IPI, de um carro como o Sorento, de 55% - contra 25% do nacional. Isso é na ponta, na nota fiscal de venda.Some-se a isso ICM de 12%, PIS/Confins mais 11,6%. A grosso modo você traz o carro por 100 e precisa vender a 300 e pouco para pagar o custo.

Terra - E no caso do carro nacional?

JLG -

Aí entra muito o lucro dessas empresas.

Terra - O motor flex ainda faz diferença no momento de decidir a compra de um carro, mesmo com o preço do etanol pouco competitivo?

JLG -

O etanol e a gasolina variam. Amanhã ou depois sobe a gasolina, abaixa o etanol. O brasileiro quer o flex porque ele tem o poder da decisão na hora de abastecer. Com motor só a gasolina você não tem opção, tem que abastecer com aquilo que está na bomba. Você lança um produto flex para vender, muda completamente.

Terra - O senhor acredita que o brasileiro está muito endividado?

JLG -

A gente sente pouco. Por que o grande problema é quando o consumidor vai comprar um carro popular e não pode dar entrada. Então ele dá 20%, 10% de entrada e o restante financia em 60 meses. Esse consumidor é preocupante para o banco, porque se ele para de pagar, o produto desvaloriza muito e não cobre a dívida. Quando o banco toma o carro de volta, perde uma fábula, porque o carro não vale o que o cliente deve. No nosso caso, o cliente compra um carro importado, com preço maior com 50%, 60% de entrada. Então ele não para de pagar. Por exemplo, o cliente compra um Sportage de R$ 100 mil e já tem um carro de R$ 50 mil, R$ 60 mil. Ele dá uma entrada de R$ 70 mil e financia o restante. Ele vai pagar. Ele não quer perder R$ 70 mil. Agora quando o cliente compra um carro barato e que desvaloriza 30%, 40% no primeiro ano, você tem um problema de financiamento, porque o banco não quer emprestar para ele.

O jornalista viajou a convite da empresa.

Fonte: Terra
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